terça-feira, 19 de novembro de 2013

Motim



Cheguei, tirei os sapatos e a mochila pesada das costas, tirei os óculos embaçados das lágrimas derramadas, e me joguei em meio à bagunça do meu quarto.
Olhos fixos no teto branco, encaro com frieza a lagartixa que passeia presa ao teto. Na parede algumas fotografias também desordenadas.
Pelo chão roupas sujas, limpas, alguns pares de meias perdidos, sapatos com os pares separados, cama por esticar, ursinhos jogados, embalagem de chocolate, e a caixa de lencinhos vazia...
Ligo a tevê e percebo que não é só meu quarto que necessita de limpeza e arrumação.
“O mundo está ao contrário e ninguém reparou.” Ninguém repara, ninguém se importa se o mundo, ou, seu quarto está bagunçado; (as pessoas estão ocupadas demais para isto).
Minha mãe bate na porta.
“Entra”.
Respondi com a mesma frieza que olhei para a lagartixa.
“Mas que bagunça é esta Elizabete? Vamos, vamos arrumar este quarto. Você não tem vergonha de trazer suas amigas aqui desse jeito?”
(Retiro o que eu disse quando falei que ninguém repara. Mães... elas reparam tudo. E mais, te obrigam a arrumar).
Mas é que hoje eu quero deixar ele assim mesmo, bagunçado, sujo.
E quero ficar aqui do jeito que ele está. Ninguém, (além da minha mãe) vai entrar aqui, muito menos notar que as coisas estão fora do lugar. 
Quero ficar aqui com minha bagunça, tendo a lagartixa como amiga, e o teto branco como companhia, logo mais a noite chega, eu apago a luz, e posso chorar em paz.
Sem explicações e faxineira pra “arrumar” minhas coisas. Só eu, bagunça,  lagartixa e  só.
Sós!
Um estalo...
A bagunça “cria vida,” (como uma animação de desenho), e começa uma espécie de ‘guerra de travesseiros’ nada divertida.
Guerreiam para ver quem me destrói primeiro. 
A princípio pareço forte e inatingível, as horas passam, e o cansaço é eminente.
Me entrego.
Não posso lutar sozinha contra o motim da bagunça do meu quarto.
Eles são muitos, e  seria em vão, encará-los sozinha.
É tanto  tanto,  que me perco de mim em meio à bagunça, e a rebelião.
Começo a me procurar...
Dentro do armário, debaixo da cama, atrás das cortinas, por entre os pares de meias...
Impossível, enquanto não colocar tudo em seu devido lugar não me encontro mais.
E talvez perder-se, seja a melhor forma de se encontrar inteira novamente, ainda que para isso demore anos,  vinte e sete. Ou, quem sabe, isso dure só essa noite.
Isso não vem ao caso.
Cansada, perdida dentro do próprio quarto, me deito encima do monte de roupas pelo chão novamente.
Olhos fixos no teto, adormeço.
Para quem sabe em sonhos eu possa me encontrar em ordem e feliz.
No meu, ou, no quarto que era nosso. 

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